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O novo vizinho rico

Uma conspiração do destino levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a visitar Georgetown, a capital da vizinha Guiana, país com pouco mais de 800 mil habitantes, ex-colônia inglesa, colonizada por negros, holandeses, indianos e nativos, que produzia, até pouco tempo, apenas açúcar, arroz e alguns bens primários na sua agricultura. Era um dos países mais pobres do Ocidente. O presidente brasileiro transformou-se numa espécie de salvador da pátria diante da ameaça do homem forte da Venezuela, Nicolás Maduro, de invadir o pequeno país e tomar posse de mais da metade de seu território, chamado de Essequibo, riquíssimo em petróleo e outros minérios valiosos.

No campo econômico, a visita de Lula ocorre no momento de notável expansão econômica experimentado pelo minúsculo país desde 2019, quando começou a exploração de petróleo naquele país. A Guiana deixou de ser um dos países mais pobres do Ocidente, para se transformar em uma das economias que mais cresce no mundo. Entre 2019 e 2023, o Fundo Monetário Internacional estima que o Produto Interno Bruto do país tenha saído de US$ 5,17 bilhões para US$14,7 bilhões, um crescimento de 184%. Nesse período, o fluxo comercial entre Brasil e Guiana aumentou 2.700%.

O Produto Interno Bruto (PIB) per capita — a divisão da riqueza do país pelo número de habitantes — também cresceu. De acordo com o Banco Mundial, o PIB per capita saiu de US$ 6.477 em 2019 para US$ 18.199 em 2022. Esse valor é mais que o dobro do PIB per capita brasileiro que, em 2022, foi de US$ 8.917. A presença do Brasil neste canteiro de obras global ainda é considerada tímida. Uma empresa brasileira, a Álya Construtora, antiga Queiroz Galvão, ganhou a licitação para a construção de um trecho de 121 quilômetros de rodovia que liga Lethem, na fronteira com o Brasil, a Linden, no rumo de Georgetown. A estrada existe, mas precisa ser melhorada e pavimentada.

A Exxon Mobil descobriu uma enorme reserva inexplorada de petróleo em águas territoriais do país em 2015, área chamada de Margem Equatorial. Os estimados 11 bilhões de barris de petróleo do Bloco Stabroek provocaram a maior arrancada econômica do mundo. O petróleo quadruplicou a economia do país, que alcançou a segunda posição no ranking de riqueza por habitante em 2022. Ficou atrás, apenas, do Uruguai. A Exxon Mobil mantém 63 projetos de perfuração no bloco, com uma produção diária estimada em 600 mil barris de petróleo por dia. As projeções são de que o crescimento chegue a 1,2 milhão de barris por dia em 2027. As estimativas dizem que o país deve superar o Kuwait, em breve, como maior produtor mundial per capita do combustível fóssil no mundo. Empresas chinesas também operam no local.

O Brasil ganhou um vizinho milionário, que ainda está se acostumando à nova realidade. Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, esticou o olho grande para as fabulosas reservas de petróleo encontradas a 200 quilômetros da costa. Mas ele governa sobre as maiores reservas de petróleo do mundo. A empresa estatal PDVSA chegou a produzir três milhões de barris/dia. Hoje, produz pouco mais de 400 mil por causa de interferências políticas na empresa. Mas a anunciada disposição de anexar a região de Essequibo é um bom argumento para sensibilizar o eleitor nas próximas eleições presidenciais. Pela primeira vez, desde a disputa pelas ilhas Malvinas, há um clima de guerra na América do Sul.

Lula tenta negociar uma trégua, uma paz e alguma tranquilidade para a diplomacia do continente. É preciso lembrar que ele correu riscos ao receber o presidente da Venezuela em Brasília com honras de chefe de Estado. Foi muito criticado por sua tentativa de incluir o dirigente no âmbito latino-americano. Ele também negociou com os norte-americanos a cessação das sanções econômicas desde que a democracia fosse restabelecida em Caracas. Lula foi à Guiana para evitar o conflito e postergar a solução de uma crise que tem mais de 200 anos. Levou a ministra Simone Tebet, que percebeu as oportunidades de investimentos neste novo vizinho rico.

A cidade de Georgetown, que tem seu porto aberto ao Oceano Atlântico, fica mais próxima de Boa Vista, capital de Roraima (650 km), do que de Manaus, a mais de 800 km. E o porto de Manaus se situa no Rio Amazonas, que demanda quatro dias de navegação até o oceano. O porto da capital da Guiana pode se transformar no grande centro de expansão da economia do norte do país, sobretudo da Zona Franca de Manaus. O mercado dos países do Caribe ficaria mais próximo ao produtor brasileiro, sem esquecer que a Guiana é ex-colônia inglesa e mantém fortes vínculos com a pátria mãe. A Inglaterra não faz parte da União Europeia. É um grande mercado. Lula foi resolver um problema de fronteira e encontrou formidável oportunidade para desenvolvimento do norte do Brasil.

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