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Cadeia de fornecedores faz do Brasil referência na venda de soluções em óleo e gás

O avanço na exploração do pré-sal, que alçou o Brasil ao grupo dos dez maiores produtores de petróleo e gás do mundo e tornou o país exportador líquido da matéria-prima e seus derivados, é, antes de tudo, uma jornada de desenvolvimento tecnológico.

E, embora a Petrobras seja a âncora do processo, boa parte da inovação ocorre na cadeia de fornecedores de bens e serviços. Incluindo o Hisep (separador de alta pressão, na sigla em inglês), tido como uma tecnologia disruptiva, que será produzido pela gigante franco-americana TechnipFMC.

A descoberta do pré-sal, em 2006, chamou a atenção pelo gigantismo das reservas, mas, desde o início, estava colocado o desafio de tirar o petróleo de milhares de metros abaixo do solo marinho, a milhares de metros abaixo da lâmina d’água.

Foi preciso desenvolver equipamentos, como tubos e dutos, para lidar com condições extremas de pressão. A produtividade apresentada atualmente demonstrou que é possível produzir a custos competitivos, deixando para trás as desconfianças iniciais.

— Alguns campos do pré-sal possuem elevado teor de CO2 no fundo de reservatório e elevada “razão gás-óleo”, que é o quanto de gás é produzido para cada barril de petróleo — conta Fabio Passarelli, consultor sênior de tecnologia da Petrobras.

Mais peso e custo maior

Para lidar com isso, as FPSOs (navios-plataforma) do pré-sal são mais complexas. Têm mais unidades de processamento de gás, para separar do petróleo, o que os torna mais caros e mais pesados — cerca de 65% do peso e da área da plataforma são dedicados a processar o gás. Por isso, melhorar esse procedimento sempre esteve na mira dos pesquisadores da Petrobras.

— Entre 2013 e 2014, os pesquisadores se deram conta de que esse gás, cheio de CO2, quando pressurizado se comporta como líquido. Esse fato destravou o potencial de usar bombas submarinas que já existem. Descobrimos que poderíamos desenvolver um sistema que, primeiro, separa o gás rico em CO2. Uma vez separado, passa pela bomba e devolve para o reservatório, tudo lá embaixo (no solo marinho) — completa Passarelli, ao resumir a ideia por trás do Hisep.

A expectativa é que a nova tecnologia diminua o custo de produção das FPSOs, reduza as emissões de carbono dos equipamentos e do próprio processo de produção e até aumente a quantidade de petróleo retirado dos reservatórios, por causa da reinjeção do gás.

No início deste ano, a TechnipFMC firmou contrato de mais de US$ 1 bilhão para fazer os testes finais, fabricação e operação comercial do Hisep. O plano é instalar o novo equipamento em poços do Campo de Mero, parte do Bloco de Libra, em 2028.

A Petrobras e seus sócios no Bloco de Libra — Shell, Total e as chinesas CNPC e CNOOC — já investiram US$ 1,7 bilhão no desenvolvimento da tecnologia, que tem parceria com a Universidade Federal de Itajubá (Unifei), em Minas.

Antes de chegar ao disruptivo Hisep, a evolução do pré-sal já havia tornado o Brasil um polo de produção e exportação de “árvores de Natal” molhadas, equipamentos submarinos fixados nas bocas dos poços em alto-mar, para controlar a vazão da extração.

A demanda da Petrobras e demais operadoras do pré-sal atraiu investimentos de fornecedores como a TechnipFMC, a norueguesa Aker Solutions e a SLB, novo nome da francesa Schlumberger. No fim do ano passado, Aker, SLB e Subsea7 combinaram suas operações offshore na joint venture OneSubsea. Apenas Brasil, EUA, Noruega, Reino Unido e Malásia produzem esses equipamentos no mundo, segundo a Abespetro, associação nacional dos fornecedores da indústria de petróleo e gás.

‘Evolução energética’

Segundo Telmo Ghiorzi, secretário-executivo da Abespetro, para além da jornada de tornar viável a exploração do pré-sal, a “evolução energética”, em substituição à ideia de transição energética para uma economia de baixo carbono, é o principal motor da inovação tecnológica na indústria. E várias empresas estão investindo em diversas apostas, ora com a estratégia de avançar em várias frentes, ora escolhendo algum caminho a seguir:

— As petroleiras estão induzindo essas tentativas, demandando da cadeia produtiva, que é quem de fato vai desenvolver essas inovações — afirma Ghiorzi, para quem o Brasil tem uma posição privilegiada. — Temos muito o sol, vento, minerais estratégicos, petróleo, e muita energia elétrica. Então, temos os ingredientes necessários para adotar quase todos os caminhos.

Além de ser quem de fato coloca as novas tecnologias no mercado, a cadeia de fornecedores tem uma vantagem em relação às petroleiras, que é a capacidade de se adaptar para fornecer para novas demandas.

Quem presta serviços de apoio à exploração em alto-mar, por exemplo, poderá atender também as usinas eólicas offshore, mesmo que elas sejam comandadas por novas companhias, e não pelas tradicionais petroleiras.

A holandesa SBM Offshore, tradicional operadora de plataformas flutuantes, por exemplo, já anunciou que incluirá a geração de eletricidade eólica offshore em sua estratégia.

Segundo Thomas Filiponi, diretor-geral da SLB no Brasil, a própria mudança do nome da companhia passa por uma nova estratégia global, focada na “descarbonização” da exploração de petróleo e gás, em ampliar a atuação na cadeia de “novas energias” e na “área digital”.

A multinacional francesa fechou recentemente seis contratos com a Petrobras, no valor total de US$ 1,1 bilhão, incluindo a prestação de serviços de coleta e armazenamento de dados industriais referentes às FPSOs (as plataformas flutuantes), refinarias e outras instalações.

Segundo a SLB, será um dos maiores sistemas da empresa no mundo, contribuindo para “maior eficiência na tomada de decisões, a partir da interpretação dos dados coletados”.

— Na nossa fábrica de Taubaté (SP), temos um centro de pesquisa para desenvolver tecnologia de eletrificação de completação. Todo poço perfurado tem que ser completado, hoje, com equipamentos hidráulicos, que necessitam de fontes não renováveis — diz Filiponi.

Para além das fabricantes de equipamentos submarinos, a Omni Táxi Aéreo apresentou na ROG.e a Camcopter S100, drone para o transporte de cargas para plataformas offshore. Em julho, o drone fez um voo teste, à noite, de 200 quilômetros, entre a Base de Imbetiba, em Macaé (RJ), e a plataforma marítima P-51, o que abre possibilidades de melhorar a eficiência e a segurança na entrega de cargas.

Ajustes nas políticas

Diante das oportunidades para o Brasil, Ghiorzi, da Abespetro, chama a atenção para a importância de se ajustar as políticas públicas. Para o sucesso do Hisep, por exemplo, redundar em exportações de equipamentos de alto valor agregado, será preciso promoção comercial no exterior, com foco geopolítico, como fazem as grandes economias desenvolvidas.

Além disso, Ghiorzi cobra ajustes na política de pesquisa e desenvolvimento da ANP, a agência reguladora do setor. O marco regulatório prevê que as petroleiras concessionárias de campos de petróleo e gás destinem parte de suas receitas para investimentos em pesquisa — atualmente, são cerca de R$ 4 bilhões por ano.

Contudo, as regras atuais incentivam que os recursos sejam todos direcionados para ciência básica nas universidades e dificultam o investimento em inovação nas empresas da cadeia de fornecedores, critica o executivo da Abespetro.

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